Um exemplo de liberdade


Rentes de Carvalho deu a semana passada uma monumental bofetada sem luva aos homens e mulheres do sistema e do politicamente correto. Votou no partido de Wilders, explicou porquê e deixou os indignados do costume a falar sozinhos


As eleições na Holanda foram mais um exemplo de como esta gente não tem emenda. As eleições e o segundo lugar do Partido da Liberdade foram tratados como de costume. Com uns extraordinários exercícios de malabarismo, com omissões, muitas mentiras e falsas vitórias gritadas aos quatro ventos. Ora vejamos.

As sondagens do sistema começaram por dar o partido de Wilders em primeiro lugar. Nas últimas semanas, quando começou a guerra verbal e diplomática com a Turquia, com o governo liberal a ser claramente beneficiado pelo islamita radical Erdogan, o partido do primeiro-ministro Rutte passou a liderar a corrida. Os resultados finais, e não as sondagens do sistema, deram a vitória a Rutte e o segundo lugar a Wilders.

Os trombones do sistema gritaram vitória e, na Europa, os derrotados do costume fingiram muito alívio. E até houve um ministro português, muito caceteiro em tempos do outro senhor, que proclamou o fim do populismo na Europa. A realidade, essa malvada, é outra. O Partido da Liberdade de Wilders não só ficou em segundo lugar como ganhou cinco deputados em relação às eleições de 2012. Já os dois partidos do governo foram castigados de modo muito duro. Ainda que seja o partido com mais votos, o VVD de Rutte teve menos 5% dos votos (menos oito deputados) e o PvdA (Partido Trabalhista) perdeu até 20% (tem menos 29 deputados). Juntos, perderam cerca de metade dos lugares no parlamento. Isto é uma derrota histórica cuidadosamente escondida pelos arautos do sistema e seus lacaios. Os mesmos que atacam nas redes sociais e na comunicação social quem pensa de forma diferente e combate o pensamento único.

Exemplar neste combate, sem papas na língua, o escritor português Rentes de Carvalho deu uma extraordinária lição de liberdade nestes tempos de mordaças e censuras. Vale a pena, por isso, reproduzir neste espaço de liberdade extratos da entrevista que Rentes de Carvalho deu ao jornal online “Observador”. Vale a pena pelas perguntas de um jornalista do sistema e do politicamente correto, vale a pena pela coragem, clareza e liberdade das respostas do escritor.

Não teme eventuais consequências junto dos seus leitores habituais por ter declarado esta intenção de voto? Pergunto isto porque Wilders é sobretudo associado a ideais como a islamofobia, nacionalismo, princípios de extrema- -direita…

Temer eventuais consequências? Nunca isso me passaria pela cabeça. Nada tenho a ver com os meus leitores, não lhes devo coisa nenhuma, tão-pouco me interessa o seu favor ou desfavor, ou que eles suponham poder-me associar com Wilders, a islamofobia, a extrema-direita, o partido dos animais ou os vegetarianos. Não pertenço, não me associo, não tiro proveito. Sou livre e ajo com liberdade, nenhum interesse material, político, económico, social ou outro tem poder para coartar a minha liberdade. Claro que sofro as consequências e sei o preço dessa liberdade. O não ter cantado loas ao 25 de Abril, paguei-o com quarenta anos de desdém e ostracismo. De nada contou ser na Holanda um escritor bestseller, um jornalista respeitado, um docente universitário de boa fama, um sujeito estimado. Em vez de dizer que nem as moscas nem o excremento tinham mudado, teria sido proveitoso entrar no coro e gritar que, finalmente, o sol brilhava para todos, até para os deserdados.

Como cidadão com dupla nacionalidade a viver na Holanda, não teme que eventualmente políticas anti-imigração o possam atingir?

Desculpe que lho diga, mas a sua pergunta denota irrealidade. Com Wilders a governar, a Holanda é bem capaz de decidir pela deportação de criminosos, e eu não me incluo na categoria. Fora essa improvável situação, a Holanda não vai deportar ninguém.

O que quer dizer com “vinte e tal anos de governos tão politicamente corretos” na Holanda? Que “correção política” é esta de que fala?

Não me diga que ignora o significado da expressão, mas vou fingir que sim: as substanciais ajudas a países subdesenvolvidos que resultam no financiamento da corrupção; o extraordinário interesse pelo aquecimento do planeta, as energias limpas, a poluição, raro dando oportunidade a que se façam ouvir os que defendem outros pontos de vista.

Nestes tempos miseráveis em que tudo o que foge do pensamento único é atacado, insultado e mesmo proibido, Rentes de Carvalho é ar puro, limpo da poluição desta gente que ainda não percebeu que a vitória do Brexit, de Trump e o segundo lugar de Wilders são sinais de liberdade num mundo opressivo em que o pensamento livre se arrisca a ser condenado a passar umas temporadas largas nas estâncias de esqui da Sibéria.

Jornalista